Entrevistas

Entrevista com Frejat, a figura-chave do rock brasileiro

Roberto Frejat é sem dúvida alguma uma das figuras-chaves do rock brasileiro, e conhecer sua história é crucial para entender melhor uma parte substancial da evolução do rock feito em terras tupiniquins.

Parceiro musical de Cazuza, participou de cinco edições do Rock in Rio, inclusive a histórica primeira edição, consagrou diversos hits nas rádios, seja na voz do já citado Poeta, dele próprio ou de outros intérpretes, desempenhou papel central em uma das maiores bandas de rock brasileiro, primeiro “apenas” como guitarrista e compositor, e depois também como vocalista e frontman,  e conseguiu conduzir com dignidade e solidez artística uma carreira que já dura inacreditáveis 35 anos.

Inacreditáveis pelo vigor e energia que Frejat ainda apresenta, já que neste tempo todo o que não faltou foi produção musical, concretizada em diversos discos e DVD’s, shows, e na admiração e respeito de suas centenas de milhares de fãs.

Na entrevista a seguir, Frejat fala sobre suas influências, seu início na música, sua história com o Barão Vermelho, Cazuza, processo composicional, carreira solo, produção, novos projetos e muito mais. Aprofundem-se no universo de Roberto Frejat. Sejam bem vindos.

Frejat, sua história pós-Barão é bem conhecida pelos seus fãs, mas que eu queria saber um pouco sobre o período de formação, quando você começou a tocar. Li que você não gostou muito do primeiro professor e violão. Como foi esta história?

Na verdade é o seguinte, assim: Quando eu tinha uns dez anos eu já gostava de música muito, já comprava discos, já era amarradão em rock’n’roll, e aí eu pedi um violão pros meus pais, de aniversário.

E eles me deram um Di Giorgio que tenho até hoje, aliás muito bom, e eu na época comecei a ter aulas com um professor, que é um cara que não tinha nada a ver com tudo que eu queria aprender, primeiro porque ele não sabia nada de música pop, era um cara que trazia um caderninho, com a leitura musical,  quer dizer, ali ele já queria botar um garoto de dez anos pra ler música, quando na verdade eu estava interessado em música pop, não estava interessado em música erudita…

E o repertório que ele trazia era um repertório totalmente desinteressante, coisas como a música-tema do O Poderoso Chefão, tema do Love Story, quer dizer, ele era um cara que foi completamente desatento ao que o professor tem que ter como principal elemento quando ele tá tentando estimular um aluno, que é justamente buscar as motivações dele, né, por que que ele quis aprender o violão? Ah, ele quer aprender isso? Então vamos lá, eu posso até levar ele pra outro lugar depois, que eu acho que é legal ele conhecer, mas primeiro eu tenho que satisfazê-lo, né? Primeiro eu tenho que fazer ele se sentir feliz de estar tocando o que ele gosta de ouvir, o que ele tá afim de tocar.

Eu acho que este cara cometeu este equívoco assim radical, né? E aí por conta disso eu fiquei quatro anos sem tocar violão, até que eu fui a um outro professor, que era até um amigo da minha mãe, um cara que tinha trabalhado com ela numa repartição pública, e era um cara que era louco por música brasileira, completamente xenófobo, era um cara assim que achava que guitarra, só jazz (risos).

Deste tipo assim. Mas ele dava aulas na Proarte, que é um seminário de música que existe até hoje aqui no Rio, que é uma escola muito conceituada, e que tinha vários outros professores, de vários outros instrumentos, inclusive lá eu descobri que tinha um professor de guitarra, mas durante um ano, um ano e meio, eu tive aulas com este professor, e foi muito importante pra mim, principalmente pelo lado de compositor, porque ele me deu toda a parte de harmonia básica de música brasileira, entendeu?

E neste momento que eu tava aprendendo a tocar, eu já tava curtindo muito música brasileira também. Eu já tava começando a assistir a shows dos Novos Baianos, já ouvia Chico Buarque, Gil, Caetano, então pra mim foi interessante, ele me apresentou Cartola, então foi uma coisa assim também que veio num momento muito bom. Aí um ano depois é que eu passei pra guitarra, quando eu tinha mais ou menos uns 15 anos, aí eu passei pra guitarra, quis ter aula de guitarra, comprei uma guitarra, e aí que começou toda esta história.

Este segundo professor, que te apresentou Cartola, era o Gaetano?

Não, o Gaetano Galiffi é justamente o professor de guitarra que vem a seguir, que é o meu professor de guitarra e que eu descobri que também dava aulas na Proarte. O Gaetano, na verdade todo mundo chama ele de Kay, é muito difícil pra mim chamar o Kay de Gaetano, apesar dele ter escrito o livro dele como Gaetano, e tudo, eu sei que ele se chama Gaetano, mas pra mim é muito difícil porque a vida inteira chamei ele de Kay, que é o apelido dele, todos os alunos chamavam ele assim. Bom, de qualquer jeito, o Kay foi muito importante pra mim.

O Luis Felipe, que foi este professor de violão, foi importante também, porque ele me deu esta base de harmonia, e principalmente de conhecer os acordes dissonantes, isso foi muito legal pra eu não ficar preso só a uma coisa mais simplista do rock’n’roll, mas o Kay, ele me abriu a minha cabeça pra tudo, assim. Por exemplo, na época em que eu comecei a ter aulas com ele, eu só aprendia de ouvido. Então por exemplo, ele me passava os exercícios, eu tinha um bom ouvido, eu decorava os exercícios e  era um aluno super “Caxias”, então eu voltava na semana seguinte com os exercícios super praticados e tal, e eu imagino ser isso a alegria do professor.

Só que chegou um momento em que os exercícios começaram a ficar difíceis, já ficava difícil decorá-los, antes de aprendê-los. Foi quando ele começou a me ensinar leitura. Então ele me ensinou a ler música, pra eu poder fazer os exercícios que ele tinha pra eu estudar, e aí foi um outro momento. Neste momento em que eu comecei a aprender leitura com ele, eu já tava fazendo também um curso de teoria musical básica na Villa-Lobos, que é uma escola de música pública aqui do Rio de Janeiro. Então eu fiz o curso de teoria básica, tinha até umas aulas livres que eram muito interessantes também, que eram um pouco mais sofisticadas, e o Kay me ensinou a ler.

Hoje, eu só não tenho a prática da leitura por falta de prática profissional. Se eu tivesse sido um cara que tivesse usado a leitura de partitura usualmente dentro do meu dia a dia, com certeza eu estaria lendo muito bem, mas hoje eu praticamente não leio. Eu sei onde estão as notas, mas eu não leio música, entendeu? Por absoluta falta de prática, isso é uma coisa que eu até lamento, eu deveria ter me preocupado em manter porque eu acho que é sempre um instrumento bacana de aprendizado, eu tenho uma porção de livros que agora eu vou ter que me reeducar pra poder voltar a praticá-los.

Em relação a influências, uma vez você me disse que Hendrix é uma das suas principais…

(interrompendo) O Hendrix pra mim na verdade é o meu guitarrista referência. Mas eu ouvi muita coisa, Pepeu foi muito importante pra mim, numa época aqui no Brasil, porque era o guitarrista com quem eu tinha uma referência direta, porque uma coisa é você gostar de Hendrix e ouvir no disco, outra coisa é você ir lá e assistir o Pepeu. É uma outra maneira de você aprender e absorver. E aí neste sentido, tem outros guitarristas, mas o Pepeu foi muito marcante, porque ele me mostrou como é que o Hendrix cabia dentro da música brasileira.

Este pra mim é o grande divisor de águas do Pepeu na minha vida. Agora, junto com Pepeu eu assisti muita gente boa que foi muito importante pra mim. Aí eu poderia citar Carlini (Luis Carlini), poderia citar Robertinho de Recife, poderia citar Sérgio Dias, poderia citar Paulo Rafael, que toca com o Alceu Valença. Acho que estes caras aí, naquele momento onde eu comecei a aprender a tocar guitarra, foram fundamentais.

Porque eram uma referência próxima. Eu podia chegar ali e olhá-los tocando, e isso pra mim foi muito importante pra eu evoluir, pra eu aprender, pra eu entender como é que aquele som que eu ouvia no disco, como é que saía, como é que você coloca o dedo na guitarra e sai aquele som que você ouve no disco? Foi com eles que eu aprendi isso.

Pepeu Gomes, uma das principais referências de guitarra no Brasil para Frejat

Fantástico. E quando você entra no Barão, qual era o repertório naquele momento? Diz a história que o Cazuza entra logo depois de você, e aí claro que vocês viram a dupla de compositores, mas e antes das composições ?

Na verdade é o seguinte, a gente entra praticamente no mesmo momento. O Barão é uma banda que o Guto e o Maurício queriam formar. Eles dois eram os únicos, diferentemente de outras bandas que começam com vários amigos de colégio, na verdade os únicos amigos de colégio eram o Guto e o Maurício. E eles começaram a procurar outros músicos pra formar o grupo, acharam o Dé, porque o Dé estudava também na ProArte.

Por coincidência tanto o Guto quanto o Maurício estudavam na ProArte, mas eu não os conhecia de lá. Eu conhecia o Dé, que já tinha visto numa apresentação de música lá, mas nunca tinha tocado com ele, mas eu sabia quem era o Dé. Quando eu fui tocar com esta banda que o Maurício me ligou, me convidou, é porque eles tinham um show pra fazer, eles tinham um compromisso, e precisavam de um guitarrista, era quase que uma gig, não era exatamente, “vem aqui, vamos formar uma banda”.

Só que aquilo ali, a gente ensaiou tanto, e aí neste momento de ensaio, foi exatamente o período de formação, de chegar o Dé primeiro, de sei lá, três ou quatro dias depois chegar eu, depois sei lá, uma semana, dez dias depois, chega o Cazuza. E aí quando a gente começou a tocar, o repertório eram algumas músicas que o Guto e o Maurício tinham feito juntos com alguns amigos, e alguns covers.

Tinha uma música instrumental do Maurício, chamava acho Uma Certa Fanfarra, que era uma coisa bem progressiva assim, e tinha o De Leve que a gente começou a  tocar, que era aquela versão da Rita (Lee, claro) pro Get Back dos Beatles, e… cara, acho que basicamente era isso. E a gente começou a preparar este repertório, só que o show não aconteceu, a gente ficou super frustrado… só que a gente chegou à conclusão de que a gente tava gostando de tocar junto.

E que a gente tava curtindo aquela dedicação que todo mundo tinha pra chegar em algum lugar. A partir daí que começou a ser feito um repertório, Cazuza mexeu em algumas letras de músicas do Guto e do Maurício, no caso, Certo dia na cidade e Billy Negão, que estavam presentes no nosso primeiro disco, e eu e Cazuza começamos a compor, e ele fez também uma música com o Maurício também naquela época que foi a Conto de Fadas, que é uma das primeiras músicas do primeiro disco.

Então quer dizer, aí com esta coisa da gente começar a fazer o repertório, a banda começou a tomar corpo, começou a ficar com cara de quem nós viramos. Acho que o fato de eu e Cazuza começarmos a compor ali, deu uma cara pra banda que ela ainda não tinha antes. E isso foi muito bacana porque aí a banda começou a ter esta personalidade, e acho que isso fez a gente evoluir muito quando a gente se apresentava junto com outros grupos, porque ficava muito claro que a gente tinha realmente uma personalidade.

Capa do primeiro disco do Barão Vermelho, de 1982

Claro, tinham criado uma identidade, mesmo.

Exatamente.

E aí quando o Cazuza sai, é incrível o quanto você consegue assumir os vocais e manter a banda de pé, a gente imagina como deve ter sido difícil assumir o posto de frontman e ainda fazer tudo que já fazia.

O que aconteceu foi que, no primeiro momento em que o Cazuza saiu, e aquilo foi surpreendente pra gente, porque a gente tinha tido uma discussão grande alguns meses antes, e perguntamos pra ele se ele queria sair ou não, porque aí a gente faria os shows que tinha se comprometido e simplesmente pararia ali, dali cada um seguiria seu caminho, e ele disse que não, que queria continuar.

Só que a gente começou a fazer os ensaios do disco novo que a gente ia preparar, seria um disco que acabou não existindo, e ele faltava alguns ensaios e no dia que a gente chegou na gravadora exatamente pra gravadora dizer “ó, bacana, podem entrar no estúdio amanhã, porque o orçamento tá aprovado, tá tudo certo, vocês tem as músicas, vamos nessa”, aí ele estava esperando a gente pra dizer que ele não ia continuar.

Aquilo foi uma porrada na cara de todo mundo, todo mundo ficou completamente surpreso, meio perdido, mas dentro da minha objetividade eu pensei, bom, nós temos dois problemas básicos no momento em que ele  sai, quer dizer, lógico que você tem sempre o problema de credibilidade, como reconquistar a credibilidade de ser uma banda que tá com sucesso, e de repente um dos grandes motivos do seu sucesso simplesmente não está mais.

Isso aí é uma coisa que a gente sabia que ia ter que enfrentar, e esta era uma coisa que não havia solução, então já estava solucionada(risos), a gente ia ter que enfrentar esta incredulidade até o momento em que você se prova. A outra questão era a seguinte, nós tínhamos um letrista muito especial, e eu achava isso muito importante no sentido de como ocupar este espaço num momento que ele não estava. A gente não tinha naquele momento na banda ninguém que gritasse “Eu sou capaz de escrever coisas que vão poder dar continuidade ao trabalho”.

E a outra era: quem vai cantar? A questão do canto a gente resolveu lá de uma maneira nossa, testamos todo mundo e existiam vários elementos que realmente facilitavam a minha escolha: o fato de eu já ter composto a maioria das músicas, o fato de eu cantar aquelas músicas antes do próprio Cazuza, porque eu quem mostrava pra ele a música como era… e o nosso tom de voz não ser muito diferente, né? Então acho que isso facilitou a minha escolha, não que eu tenha certeza que tenha sido isso, eu acho que no momento que as coisas foram postas ali, imagino que tenha sido isso que passou na cabeça das pessoas.

A outra questão é esta coisa da composição, eu fui buscar justamente pessoas que eu achava capazes dentro do nosso dia a dia, do universo que a gente vivia, pra poder ocupar este espaço. E aí neste caso apareceu o Arnaldo Antunes, que eu chamei pra fazer música nesta época, a Denise Barroso, que fazia parte da Gang 90, me ajudou, fez músicas comigo e também me deu duas letras póstumas do Julio Barroso… Eu, o Ezequiel e o Guto fizemos algumas coisas já na tentativa de ter um letrista interno, o Maurício procurou o Humberto Effe na época dos Picassos Falsos, e a gente foi justamente nesta busca aí. Procurei o Renato Russo e ele deu o Bumerangue Blues pra gente. Então este foi o primeiro momento ali na tentativa de solucionar esta situação.

Brou

A gente conversou há pouco sobre sua formação ter tanto rock quanto música brasileira. Não consigo entender porque algumas pessoas se espantaram quando o Barão começou a incluir elementos de música brasileira, como percussão, por exemplo.

É engraçado, você sabe que esta coisa da percussão é muito curiosa, porque desde nosso segundo disco a gente já tem alguma coisa de percussão, Peninha começou a gravar com a gente no nosso segundo disco. Não era da banda, ele só vem a entrar na banda lá na frente. Mas curioso, cara, eu com 10 anos de idade meu presente de natal foi um disco do Santana! Então pra mim esta coisa de percussão dentro do rock era uma coisa completamente normal.

E os Novos Baianos mesmo usavam bastante coisa de percussão com rock, nos momentos rock deles, o Baixinho , o Bola e o Charles Negrita, tavam juntos na banda tocando pra caralho, entendeu? Então pra mim, nunca foi… agora eu acho que assim, pro pessoal que é mais roqueiro, que não é muito ligado em música brasileira, o Barão tinha este elemento que pra uns deslumbrava, agradava, e pra outros criava um certo estranhamento “pô, estes caras são rock ou são MPB?”.

Eu lembro de um amigo meu muito querido, que era um roqueiro assim bem fanático, que ele falava “é, vocês sempre tiveram esta aproximação com a MPB”, e na verdade isso é real, o Barão é uma banda de rock, mas que se vê completamente incluída dentro da música popular brasileira, não tenha a menor dúvida disso, da mesma maneira como eu vejo o Raul, o Erasmo, a Rita, eu vejo o Barão.

Certamente. A origem do rock brasileiro está nisso, não sei porque tem gente que se espanta, se temos Mutantes, Novos Baianos, não deveria ser algo surpreendente pras pessoas.

É verdade. Mas é engraçado, que vou te falar que roqueiro xiita é uma raça, bixo! (risos).

Chato, né?

Nossa senhora! Tipo assim Ku Klux Klan, sabe? Uma coisa assim tão radical e cheio de regras, que é complicado, é até anti-rock, né? (risos).

É verdade! Rock é um estilo que prega liberdade total…

O rock é bastardo por natureza! Ele já é uma mistura do country com o blues, já é uma mistura de músicas de etnias diferentes e é tão bacana por tudo isso, esta cruzada de caminhos, isso é tão bonito dentro do rock, que acho assim que as pessoas ficarem presas a dogmas, pra mim é muita ignorância, sabe?

Perfeito. Acho que a gente tem uma visão bastante parecida no sentido de que música é música, independente do estilo. Mas quando você compõe, você define de antemão se vai sair um rock, e aí parte de um riff, ou se quer uma balada, etc?

Não, na verdade eu dificilmente sei o quê que vai acontecer… Assim, é lógico que eu posso saber se aquela… eu normalmente componho música sobre letra, o meu processo é 99% assim. Normalmente quando eu leio uma letra num papel, eu já tenho mais ou menos uma ideia do ritmo dela. Não do andamento, mas do ritmo dela. E aí a partir daí eu vou começar a tocar, e aí ela é quem vai me dar o caminho, não sou eu quem vai dar o caminho pra ela. A letra é que me dá o caminho. E também porque eu tô pensando qual é a moldura musical que aquela história precisa. Então estas duas coisas tão ali batendo e eu vou tirar um denominador comum desta equação aí.

E quando você diz que, de cara olhando a letra, você já consegue pensar num ritmo, o quê que te leva…

(interrompe, ansioso pra explicar): Não, não, não, não, isso são as coisas que acho que justamente que a música… é por isso… eu por exemplo, eu tenho um processo muito assim, eu não faço música a qualquer hora, eu não faço música em qualquer lugar – apesar de já ter feito.

Mas eu acho que é muito importante você estar num lugar tranquilo ali, porque tem um certo lance assim de você deixar vir, sabe, de você estar ali e meio que deixar a coisa fluir, você experimentar e aí de repente você toca uma coisa e fala “é, pode ser”, aí você toca outra coisa completamente diferente e fala “ih cara, é isso aqui!”, ou então você toca outra coisa completamente diferente e fala “é, realmente, o outro caminho era melhor”, e eu acho que isso é importante porque a música mesmo, o próprio processo ali te conduz pra algum lugar, eu acho que você fica muito mais à mercê do que sob controle. É lógico que com o tempo, você vai tendo, vamos dizer assim, instrumentos pra conduzir ou pra melhorar ou aperfeiçoar as músicas, mas decidir, quem decide é a música, não é você.

E no caso da letra, além de escrever em parceria, você também faz sozinho?

Cara, assim, na verdade, eu trabalho muito com letristas, eu dificilmente sou a pessoa que começo a letra, normalmente ou eu ajudo a terminar, ou se ela já vem pronta, eu mexo, ou não mexo, se eu acho que a música cabe perfeitamente. O que acontece é que na verdade eu acho que aquilo ali tem que falar alguma coisa que eu acredito. Mesmo que seja um personagem que não sou eu.

Pode até ser uma coisa completamente diferente do que eu penso, mas eu acredito que exista uma pessoa que pense daquele jeito. Por exemplo, eu já fiz uma música com o Leoni, que é meio que assim, é uma história de um cara em um dia de fúria, sabe aquele filme, o cara pira e sai destruindo o país, quebrando a cidade? A música é um pouco isso, é um cara que simplesmente perde a cabeça e sai fazendo barbaridades e falando barbaridades, e eu não sou este tipo de pessoa, mas eu consigo ver este cara. Então pra mim, existe música nele, e eu vou atrás desta música.

E voltando a falar em influências, você gosta bastante de Roberto Carlos, né? Chegou até a produzir um belo tributo, REI , com o pessoal do rock brasileiro. Conte um pouco desta experiência.

Roberto e Erasmo, né? Na verdade eu fui convidado pelo diretor artístico da Sony na época, que era o Jorge Davidson, e também pelo presidente na época que era o Roberto Augusto. Eles me chamaram porque a companhia queria fazer uma homenagem ao seu artista mais importante, e também queriam aproximar o Roberto de um público mais jovem, porque o Roberto tava muito ligado a um público mais adulto, e eles achavam que era importante ter este resgate da obra dele para um público mais jovem.

E aí me convidaram pra fazer e sugeriram que eu aproveitasse ao máximo o elenco da própria companhia, que seria mais fácil de autorizar, de conseguir participações, mas que eu também ficasse livre pra chamar outras pessoas que eu achasse que eram relevantes para o projeto. Então eu fui escolhendo várias pessoas e foi muito bacana, cara, eu sou muito orgulhoso daquele projeto, eu acho que ele teve um resultado maravilhoso, e acho que desde então o Roberto veio forte pra molecada, né?

Capa de REI, tributo a Roberto e Erasmo produzido por Frejat, com arte de capa feito por Angeli

Sim, depois os Titãs também gravaram, depois deste disco…

Depois gravaram É Preciso Saber Viver, hoje você vê, tem banda cover aí de Roberto Carlos com molecada, tem o Del Rey aí com o China, que faz uma leitura de Roberto Carlos maravilhosa, então acho que tem muito disso aí. Acho que isso é um pouco reflexo daquele projeto também. E ali também pô, tem Chico Science… A primeira música do Chico Science que tocou nas rádios foi tirada daquele projeto ali, Todos Estão Surdos.

Uma curiosidade interessante de você ser fã de Erasmo, é o fato do Billy Brandão (guitarrista) tocar com você e com ele, né?

Isso veio depois, né? Na verdade a minha relação com o Erasmo começou um pouco antes, mas é muito bacana ele curtir tocar com o Billy, ter o Billy lá na banda dele, é muito legal dividirmos um guitarrista (risos).

Você sempre dividiu guitarra com outro guitarrista e seus projetos, tinha o Fernando no Barão, o Billy na sua carreira solo… fale um pouco sobre isso.

Cara, eu gosto de tocar com outros músicos. Eu gosto de fazer música coletivamente. E assim, apesar de eu ser um guitarrista que poderia encarar um power trio, não é pra mim meu ambiente favorito não, eu gosto de ter outro guitarrista pra tocar junto, tive o privilégio de durante anos poder tocar com um dos melhores guitarristas do mundo, na minha opinião, que é o Fernando Magalhães, eu acho ele um dos melhores guitarristas do mundo, mesmo.

De rock, conheço poucos que toquem uma guitarra de rock como ele, aprendi muito com o Fernando, a gente evoluiu muito junto, se aperfeiçoou muito junto, e tenho muito prazer em tocar com o Billy também, e às vezes tem alguns guitarristas substitutos dele também, como o Gustavo Corsi que já esteve fazendo muitas vezes com a gente, que é um guitarrista maravilhoso, que também gosto muito de tocar junto, o meu filho,Rafael que tem me dado prazer de às vezes estar junto comigo nos shows, também é um barato tocar com ele, fazer um som junto, eu curto, sabe?

Há pouco a gente fez um show com uma super banda em que eu, Dado (Villa-Lobos) e Liminha éramos os três guitarristas, Bi (Ribeiro) e (João) Barone eram a cozinha, pô, a gente curtiu pra caramba, cada um achar sua coisa, e vai compondo uma textura que no final é uma soma dos três, é muito legal, eu particularmente gosto de tocar guitarra com mais de um guitarrista.

O Gustavo Corsi eu acho que ainda não conheço.

Tocou com a Marina, hoje ele tem tocado com o Leoni, o Léo Jaime, com a Paula Toller… é uma pessoa adorável. Ele é o guitarrista dos Picassos Falsos.

Ah, sim. Mas o Billy e o Fernando tem sido os mais constantes, né?

Sim, são os mais presentes, são os guitarristas que eu toco há mais tempo junto. O Sérgio Serra também é outro que tocou um tempo com o Barão e foi bacana, na época ele não tinha ainda a maturidade que tem hoje, mas é um excelente guitarrista, hoje tenho certeza de que se estivéssemos tocando juntos estaríamos curtindo muito também.

Vi um show da turnê anterior,  A Tal da Felicidade, com várias releituras, e achei bacana que você tocou Malandragem, que é uma música que por ter ficado famosa na voz da Cássia, pouca gente sabe que é sua e do Cazuza.

É verdade.

Como foi a composição desta música, Frejat?

Na verdade a gente fez esta música para a Ângela RoRô gravar. Ela pediu uma música pro Cazuza, ele fez esta letra, eu fiz a musica, e quando a gente entregou pra ela, o disco dela já tava fechado. Aí esta música ficou anos perdida até o momento em que a Cássia tava gravando um disco, e o Ezequiel tava ajudando o Guto Graça Mello, que era o produtor do disco na época, a selecionar o repertório, e ele veio me procurar:

“Frejat, você tem alguma coisa pra Cássia?”, e eu já tinha participado de outros discos da Cássia, inclusive como compositor e como músico também, e falei “Ô Zequinha, eu tenho uma música que eu e Cazuza fizemos pra Ângela, que ela nunca gravou, e que eu imagino que a outra pessoa que seria perfeita pra gravar seria a Cássia, mas eu tenho que perguntar pra Ângela. E aí eu fui à Ângela, ela liberou a música, e aí eu dei pra Cássia, e foi um grande sucesso, marcante na carreira da Cássia, o que me deixou muito orgulhoso.

Roberto Frejat e Cássia Eller

É uma belíssima canção.

Eu gosto muito dela, também.

Sua carreira solo começa no comecinho dos anos 2000…

2001.

Que é quando o Barão faz a primeira pausa.

Exatamente, a primeira pausa depois de vinte anos de carreira.

E a motivação pra esta pausa foi exatamente a necessidade de dar vazão a um trabalho que talvez não coubesse no Barão?

É, exatamente isso, cara. Eu achei que naquele momento eu já tinha uma bagagem grande que me permitia fazer um trabalho que tinha a minha visão de música, e que esta visão poderia em algum momento se confrontar com a do resto do grupo, então eu achava que não fazia sentido eu impor a minha visão ao grupo, eu tinha que fazer isso sozinho. Só que quando eu comecei a fazer o disco, eu percebi que o desafio de descobrir uma sonoridade para este trabalho era tão grande que estava me desafiando a descobrir a minha própria personalidade como artista solo, e eu percebi que este desafio era muito maior do que eu tinha imaginado no começo.

Nesse momento eu fui à banda e falei, “gente, olha só, isso aqui não é uma brincadeira de um disco só. Eu acho que isso aqui é muito mais sério do que pensava e eu vou querer gravar dois discos antes da gente voltar, e foi o que a gente acabei fazendo. E eu acho que hoje, na verdade, na minha cabeça, a minha carreira solo é a minha prioridade, a coisa mais importante pra mim. O Barão é uma coisa maravilhosa que eu tenho na minha história, eu acho que um repertório lindo que a gente construiu, uma história, uma trajetória muito bonita, mas eu acho que hoje é muito mais uma celebração do que propriamente a evolução da história de um artista, entendeu?

Deve satisfazer de alguma maneira saber que você consegue transitar pelos estilos que são os que você ouvia quando você começou a tocar, rock e MPB, e que aparecem no seu trabalho de maneira muito natural.

É, eu tento fazer uma coisa que seja muito verdadeira pra mim, entendeu? O que eu digo é assim, por exemplo, eu gravei com o Quarteto em Cy a música  Chega de Saudade, que é o marco inicial da Bossa Nova lá na Casa da Bossa, gravei Pagode Russo com o Lenine lá na Casa do Forró, gravei agora uma música do Zeca Pagodinho num Samba Book do Zeca, que é um disco feito em homenagem a ele. Só que é o seguinte: Eu vou cantar um samba? Canto. Posso cantar um forró? Posso. Posso cantar uma bossa nova? Posso. Vou fazer um disco disso? Não. Não é isso, não se trata disso.

Eu sou o artista que tem talvez esta versatilidade, pra poder brincar, pra fazer uma coisa lá que é gostosa, que vai ficar bacana, porque eu tenho musicalidade pra isso, mas eu não vou bater no peito e dizer “eu canto bossa nova, canto forró, canto samba, eu canto tudo”, não. A minha praia é o meu trabalho, aquilo ali onde eu me concentro mais, estas outras coisas são momentos diletantes, e que são prazerosos porque ficam, graças a Deus, bem sucedidos, mas eu tenho muita preocupação de estar fazendo em situações onde eu me sinto capaz de fazer.

Você não vai me ver num show ou disco “Frejat canta bossa nova”, assim, é muito difícil, eu não consigo me imaginar hoje fazendo um disco de bossa nova, entendeu? E eu gosto de bossa nova, eu acho Tom Jobim a coisa mais importante que já aconteceu na música brasileira e no mundo. Mas cada um com seu cada um, entendeu?

Claro. E no caso da sua carreira solo, em que momento você está hoje?

Cara, na verdade eu tô fazendo um show que eu acho que me representa muito como artista, ele não tá ligado a nenhum disco, chama-se Frejat ao vivo. Fora isso, eu estou produzindo um disco que é o do Serginho Trombone, que é um disco instrumental, estou produzindo junto com ele, um cara que eu respeito muito, que me ensinou muito, e eu estou há muitos anos insistindo que ele precisa ter um disco pra mostrar a cara dele claramente pra todo mundo que ouve as coisas dele por aí e não sabe que foi ele.

Então acho que é importante ter esta personalidade num disco dele que é pra pessoa “ah, pô, isso aí tem a ver com aquilo lá”, sabe? Acho que é muito importante pra ele, isso. E eu tô preparando um material que eu acho que eu tenho que apresentar coisas novas, eu como compositor, as últimas coisas que eu apresentei foram em 2013, apenas duas músicas, eu acho que o disco anterior é de 2008, tá num momento de eu chegar com um repertório autoral, não importa se isso vai virar um show ou não, mas tem que ter um disco, tem que ter um repertório e é isso que eu vou focar aí durante todo este ano de 2016.

E no caso dos discos que você produz, como a gente poderia explicar isso pra um público mais amplo? Pros seus fãs, é relativamente fácil imaginar como é o trabalho de guitarrista, de compositor, mas como eles podem entender seu trabalho de produtor? Como você ajuda o artista e como você coordena a produção?

Cara, é tudo muito relativo a cada trabalho, à necessidade de cada trabalho, mas o produtor ajuda o artista a escolher quais são as melhores músicas pra ele gravar, como é a melhor forma dele gravar estas músicas, os músicos que a gente vai escolher pra gravar estas músicas, a sonoridade que este disco vai ter, qual é a foto da capa que é melhor, como é que ele vai se apresentar, como é que ele vai colocar este disco dentro da história dele, tudo isso é discutido entre o produtor e o artista. Eu acho que todas estas questões envolvem uma  relação muito forte que o produtor tem que ter com o artista porque ele é um elemento fundamental na realização deste projeto, entendeu?

Agora, nada mais importante do que o artista. Ele é o cara, ele é o motivo. Acho que o maior erro que um produtor pode ter, e muitas vezes isso é até o que o artista quer, é que o disco tenha mais a cara do produtor do que dele. Eu acho um erro, como produtor. Mas tem artista que quer isso. E neste caso, eu acho que pra mim, eu não funcionaria muito bem com este tipo de artista, porque eu não sou este tipo de produtor que vai ter uma personalidade tão grande que vai ser maior que a do próprio artista.

Você prefere entender a essência dele pra tentar realçar os elementos naturais daquela obra.

É, eu quero valorizar o que ele tem de bom, tentar ajudar ele a descobrir o quê que ele pode fazer que nem ele mesmo percebeu.

Uma pergunta meio flash-back: A gente já falou bastante do período do Barão, mas tem um vídeo que sempre me emociona, que é de vocês no primeiro Rock’n’Rio tocando Pro Dia Nascer Feliz, acredito que um ou dois dias antes da redemocratização do país.

Foi na véspera, na noite da eleição do Tancredo no congresso.

Cazuza e Frejat numa noite histórica musical e politicamente, na véspera da redemocratização do Brasil: Pro Dia Nascer Feliz

Você poderia falar um pouco das suas lembranças desta noite, deste show?

Estávamos todos numa expectativa muito grande, porque a gente já sabia ali que o Tancredo tinha sido eleito, no momento em que a gente subiu no palco, e a gente tinha uma fé de que as coisas iam mudar, de que não era possível piorar, porque a gente tava a muito tempo preso numa ditadura militar, com toda a repressão cultural que tinha, além da política, então a gente tava justamente muito feliz com aquilo, muito entusiasmado.

E naquele momento ali, eu lembro que a gente conversou no camarim sobre colocar isso ali dentro do final de Pro Dia Nascer Feliz,  e eu lembro que o Cazuza não se lembrava, na hora ele não se ligou, e aí eu grito em algum momento, eu falo assim pra ele “pro Brasil!”, aí ele se liga que a gente tinha combinado aquilo, e aí ele começa um discurso muito bonito, aí ele começa a falar as coisas todas daquele momento de esperança de uma geração nova que realmente veio fazendo coisa muito diferente de tudo.

Se você vir um filme, tem um documentário do Roberto Berliner chamado A Farra do Circo, que é um documentário que fala sobre toda esta geração dos anos 80 que em todas as áreas, a área do teatro, a área do vídeo, a área do cinema, a área da poesia, a área da música, todo mundo tava ali um pouco ligado ao Circo Voador de 82, 83. E é muito bonito você ver quanta gente saiu daquela geração e de como aquilo era diferente do que tava acontecendo na época, como a gente pensou o mundo… 

Infelizmente, a gente não conseguiu realizar plenamente, mas que com certeza seria muito melhor do que este que a gente vive hoje, porque acho que muitas das nossas coisas esbarraram dentro das capacidades que a estrutura capitalista, que o mundo corporativo, tem de conseguir de ir assimilando e diluindo propostas que o ameacem.

Frejat, voltando ao presente, o que você tem ouvido? Sobra tempo pra ouvir música?

Cara, eu tenho ouvido bem menos música do que eu gostaria, mas eu tenho escutado muitas coisas antigas e algumas coisas novas, por exemplo, eu escutei o disco novo da Elza Soares que eu adorei, gostei muito também do da Gal, gostei muito do (Jards) Macalé, que fez um disco ao vivo sensacional, e um disco do (Luiz) Melodia, isso pra falar dos “velhos novos”, ou seja, as coisas novas que o pessoal mais antigo tem feito. Eu tenho curtido, tem uma banda chamada O Terno, que é uma banda de São Paulo de rock, que eu gosto, tem o (Marcelo) Jeneci, que eu adoro, eu gosto muito do trabalho do Jeneci.

Em princípio assim, tem algumas pessoas em São Paulo que tem feito uma coisas que me agradam, tem o Tatá Aeroplano, que eu gostei também, ouvi um disco dele. Agora, lá fora, eu gosto do Jack White, Ben Harper, gosto destas coisas todas que ele faz, mas eu tenho ouvido também muita coisa de The BandElton John, coisas assim que são mais minhas, das antigas, Bob Dylan, Neil Young, estas coisas que eu gosto e que eu continuo ouvindo, Stones, Hendrix, estas coisas todas.

Do mesmo jeito que a gente consegue ouvir suas influências no seu som, Stones, Pepeu Gomes, você consegue ouvir sua influência no som desta galera que tá fazendo coisas agora no Brasil?

Cara, não tanto. Uma banda aliás que eu sinto que tem uma influência do Barão é a Suricato. Talvez seja a única que eu ouça assim e fale “ó, tem Barão aí no meio desta mistura.

É verdade. E é bem bacana o som deles.

Muito, muito. Eles agora tão com uma música no rádio que é do Rodrigo com o Paulinho Moska que é muito boa.

Paulinho que aliás, é muito bom também.

O Paulinho também tem feito um trabalho muito interessante.

Frejat, o nome do site é Não É Só Música, e uma das razões pra escolha deste nome é porque entendo que o que a gente pensa sobre ela, o que se diz sobre ela, os discursos envolvidos, também influem no fazer musical. Queria saber que espaços você acha que a música tem pra ocupar na sociedade.

Cara, eu acho que na verdade a música ocupava um lugar mais nobre na sociedade do que ela tem ocupado hoje. Especialmente a música popular, eu acho que a música popular sempre foi uma coisa muito representativa de uma coisa de uma manifestação popular, e acho que hoje está havendo uma inversão, a música que está se impondo como uma manifestação popular, justamente por uma questão de você fazer uma música muito banalizada e muito “chiclete”,  pra pessoas que tem pouca informação cultural, e aquilo pega fácil, existe este tipo de coisa.

Por outro lado, acho que a música é uma manifestação que é muito nobre, porque na verdade você não precisa ver, só precisa ter um sentido, de todos os nossos cinco sentidos, pra você poder apreciá-la, que é ouvir. E quando você ouve uma música, ela pode te levar pra lugares tão longínquos, pra situações, pra sentimentos tão intensos, e fortes, que acho que é muito impressionante como esta manifestação se apresenta. 

Continua ainda me surpreendendo a força que a música tem, quando você ouve uma música forte, seja na trilha sonora de um filme, ou você tá em casa, e de repente começa a tocar uma música que te bate, ou você tá passando por um momento na tua vida e aquela música de uma certa maneira praticamente te lê, esta coisa que a música tem sempre me surpreende, me seduz.

Sem querer criar polêmica, mas recentemente houve uma discordância entre você  e o Lobão, na questão das discussões sobre…

Cara, este assunto é um assunto muito complexo. A questão é que o Lobão acha que a presença do Estado dentro da gestão coletiva dos direitos autorais é negativa, é nociva. E nós, na verdade o meu grupo, o GAP, não sou só eu, defendemos que é necessária a presença do Estado, porque o Estado deu ao ECAD, que é o órgão que trata da gestão coletiva, um monopólio. 

E só o governo pode fiscalizar um monopólio que ele mesmo deu. E este monopólio quando foi criado, foi criado com um órgão fiscalizador, que foi extinto durante o governo Collor, e nós basicamente pedimos o retorno dele. Ou seja, a gente não pediu nada que nunca tenha existido, a gente só pediu o renascimento de um órgão de fiscalização para um sistema que é fundamental para todos os compositores e músicos brasileiros.

Eu acho que a questão do Lobão, ele tava muito ligado a um ponto político, um elemento político dentro da história, quando na verdade esta era uma questão muito mais de Estado, e não de política, entendeu? De Estado como nação. Então eu entendo até a preocupação dele,  porque a preocupação que ele tem, eu também tenho. Mas eu acho que ele não entendeu a proposta do grupo que nós participamos, tanto o meu , do GAP, quanto do pessoal do Procure Saber, que é uma opção que é realmente saudável pra música brasileira, e a gente já tá tendo retorno por conta desta posição que a gente tomou e que a gente conseguiu implementar.

Mas estas coisas acontecem e eu não queria que ficasse uma polarização minha com ele porque na verdade, não sou eu quem está contra ele nem ele está contra mim, na verdade temos opiniões diferentes, mas a vontade de fazer direito é a mesma. Eu gosto muito dele, tenho admiração por ele, tenho carinho por ele, ele é meu amigo, eu gosto dele, então eu jamais queria alimentar esta situação de que eu estou contra o Lobão, de que o Lobão está contra mim, porque isso não existe.

Como você vê as mudanças tecnológicas, o que vai acontecer com a música nos próximos anos, do ponto de vista do consumo e da produção?

Cara, acho que no ponto de vista do consumo, o streaming veio pra ficar, acho que ele é uma forma que se provou capaz de satisfazer tanto quem faz música, quanto quem quer ouvir música. A única questão que eu acho que precisa aprimorar, é a questão da remuneração, acho que está pagando mal aos músicos, dos quais ele vive, porque o streaming vive da música que é produzida pelos artistas. Eu acho que neste momento ele está pagando muito mal pelo ovo da galinha que ele tem, entendeu? Mas eu acho que isso é um processo, a gente tá lutando pra que isso melhore, e acredito que com o passar do tempo, a gente vai ter isso daí melhorado.

Frejat, pra encerrar, espero que você tenha gostado da entrevista. Já havia entrevistado você antes pra Guitar Player e fico muito feliz que tenha aceitado falar comigo pra esta minha nova empreitada editorial.

Eu fiquei muito contente com a entrevista, acho que você fez perguntas relevantes e consistentes e isso já é um grande sinal de qualidade dentro de uma imprensa musical que muitas vezes vem pouco preparada pra fazer as entrevistas, às vezes pouco conhecendo o trabalho do artista que está entrevistando. Eu gostei muito da entrevista e espero que você consiga manter este padrão de qualidade aí. Nossas experiências anteriores foram muito boas,  considero que as coisas que eu falei pra você foram algumas das coisas que depois foram melhor transcritas, do que eu falei e do que foi publicado, porque muitas vezes a gente fala uma coisa e publicam outra (risos). Então eu queria dizer isso e agradecer mais uma vez a chance de estar falando contigo sobre o meu trabalho.

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Um comentário sobre “Entrevista com Frejat, a figura-chave do rock brasileiro

  1. Excelente entrevista, em que como citado pelo próprio entrevistado, a relevância das perguntas foram o foco.
    Parabéns Ricardo.

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